BLOG DOS ADVENTISTAS DO SÉTIMO DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM

O PODER DO OLHAR


O olhar que encarcera e pune e o olhar que liberta e salva.

Por: Osman Santana Costa

Mestre em Ciências Sociais e Bacharel em Teologia Atualmente trabalha como Instrutor Bíblico em Vitória ES.

O PANÓPTICO

O filósofo Francês Michel Foulcault, em sua obra Vigiar e Punir, apresentou à sociedade um modelo de estrutura prisional cujo principio de vigilância se tornou conhecido no mundo todo. Trata-se de uma construção em forma anelar, com celas gradeadas no interior do circulo e no centro dessa estrutura, uma torre, onde ficava a sentinela a vigiar os prisioneiros. Esse modelo de prisão correspondia a uma observação total e a tomada integral por parte do poder disciplinador na vida de um indivíduo.

De acordo com Foulcault, essa construção fora baseada nas ideias de vigilância disciplinadora educacional do filósofo e jurista Jeremy Bentham, e além de ser totalmente econômica, pois necessitava apenas de um funcionário ao centro da torre, era muito funcional, pois todos os prisioneiros se sentiam vigiados a todo tempo, já que a visão daquele que estava no cume da torre era panorâmica, daí o nome “Panóptico”.

O panótico ou panópticon dava ao vigilante posicionado ao centro do sistema, controle total, uma vez que, sua posição privilegiada lhe dava poder de visão para vigiar todos os prisioneiros de uma só vez. Os prisioneiros, por sua vez, sempre tinham a sensação de estarem vigiados, e por não enxergarem totalmente o cume da torre, e essa, ainda que vazia, tinha o condão de manter nos presos a sensação constante de serem observados, os forçavam à inércia total; ou seja, a consciência da vigilância gerava também a desnecessidade objetiva da efetiva vigilância.

O PANÓPTICO SOCIAL MODERNO

Na concepção de Foulcault, o panótico é o dispositivo do poder disciplinar pelo qual a visibilidade/separação dos apenados permite o funcionamento automático da dominação. Do cume da torre, o poder. O poder da visão. O poder da coerção apensada apenas ao olhar.

Do conceito de vigilância de Bentham e Foucault, ao conceito moderno de visibilidade e poder, pergunta-se: quem, em dias atuais, já não teve a sensação de estar num verdadeiro panóptico, quando ao entrar num edifício ou noutra instituição qualquer, se deparou com o slogam: “sorria, você está sendo filmado?”. Ou mesmo teve seu carro fotografado pelos inúmeros radares “vigilantes” e punidores do excesso de velocidade? Ou ainda não sentiu curiosidade de ver um vídeo interessante postado na internet?

Existe atualmente um exercito de câmeras eletrônicas por toda parte, tendo o simples condão de vigiar e punir os “malfeitores” ou ainda somente promover e exaltar o desejo do olhar. É impressionante o poder exercido nos dias de hoje pelo olhar de todos contra todos. Isso fica demonstrado através dos inúmeros dispositivos colocados no mercado que além de funcionalidades diversas, possuem também a função de filmar ou de fotografar, como os modernos celulares que somam aos milhões e acabaram por se tornar poderosos instrumentos de vigilância e volúpia nas mãos de inúmeras pessoas.

A mídia em geral, em especial a internet, está cheias de casos flagrantes interceptados por aparelhos celulares e outros dispositivos usados nesse processo de observância social. Desde acidentes automobilísticos e cenas curiosas a crimes marcantes, nada tem fugido ao olhar “devorador” dos que estão por trás desses instrumentos eletrônicos.

Recentemente no Brasil veiculou-se o caso macabro de um empresário do ramo de alimentos que foi assassinado, esquartejado e posto dentro de uma mala pela então esposa e o crime só foi percebido e elucidado, após se verificar as imagens da câmera posicionada dentro do elevador do prédio onde o casal morava. Aqui, nesse fato, se demonstrou através dum caso concreto que a tecnologia de vigilância foi o ponto fundamental na estrutura de dominação e punição.

Ao mesmo tempo em que serve ao Estado como instrumento de punição pela promoção da visibilidade, o mesmo aparato utilizado nesse processo de coerção e vigilância de massas, exsurge também como instrumento de promoção e lançamento rápido de “celebridades”. Muitos dos modernos cantores, jogadores e pessoas com talentos diversos (alguns nem tão talentosos) tem caídos no gosto de muitos e são apresentados ao mundo graças a uma imagem ou um vídeo postado nas redes sociais, o que acaba por transformá-los instantaneamente em “celebridades” nacionais e até mundiais.

Mas, numa outra via de observação, a vigilância tecnológica também tem se demonstrado como um famigerado desejo de exaltação do individuo. Até mesmo produtores de programas de televisão perceberam o desejo de uma grande maioria em querer vigiar e também desejarem a visibilidade social. Isso sugere que o ser humano por si só, carrega no intimo do coração uma “volúpia do olhar” que tende leva-lo a um desejo egoísta de ver e ser visto. Ao que parece, esse desejo famigerado da visão tem gerado atualmente os famosos realities shows da televisão, recordistas em visibilidade.

A VISÃO QUE LIBERTA E SALVA

Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus. (Mateus 5:14-16).

Interessante a figura do panóptico quando aplicada ao contexto espiritual. Como sentinelas de Cristo, é preciso ser visto. Não com a pretensão de dominar e punir. Jesus mesmo ensinou que, como uma luz de candeia deve o crente brilhar bem intensamente sua luz para promover a liberdade e iluminar a vida dos cativos do pecado.

É preciso ser luz, porque onde há escuridão e a luz entra as trevas se dissipam. Mas é importante salientar, que a luz que irradiamos não se origina em nós mesmos. Não existe nada no homem natural que precisa ser promovido à visibilidade, pois “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Romanos 6:23). É Cristo quem precisa ser exaltado e o eu diminuído. A fonte de luz inesgotável é o próprio Deus. O Salmo 84:11, diz que Deus é “sol e escudo”. Portanto, toda verdadeira e boa obra humana, que precisa ser vista como modelo a ser imitada, tem sua origem na pessoa de Cristo. E Ele somente.

Outro importante aspecto que precisa ser visto pelos “encarcerados” de nosso tempo, é o evangelho e suas boas novas de salvação, pois ao se conhecer a verdade, há libertação (João 8:32). A ordem do Mestre foi dada: “Ide por todo o mundo” (Mateus 28:19). Quando o evangelho é pregado “as riquezas incompreensíveis de Cristo” são anunciadas (Efésios 3:8).

A cena que trará a maior de todas as visibilidades do universo ainda está por vir. “Eis que vem com as nuvens e todo o olho O verá, até mesmo os que o transpassaram” (Apocalipse 1:7). Essa é a visão que precisa ser anunciada e vivida. Essa é a visão central de toda a nossa pregação. Jesus em breve voltará.

Nesse contexto moderno de busca humana de visibilidade, precisamos aproveitar todos os meios tecnológicos (ou não), não para promoção do egoísmo humano ou ainda para dar vazão a volúpia dos nossos olhos, mas para criar uma visibilidade maior do que realmente é digno de ser admirado: a luz de uma vida justa, generosa e honesta, pautada no amor a Cristo Jesus.

Ellen White adverte: “Não durmais, sentinelas de Deus; o adversário está perto, de emboscada, pronto para a qualquer momento, caso vos torneis negligentes e sonolentos, saltar sobre vós e fazer-vos presa sua.” (Grande conflito, p. 601)

Entendendo e aceitando a responsabilidade de vigilância e pregação do evangelho, que as sentinelas de Deus, os pastores, anciãos, líderes da igreja e membros em geral, se postem ao centro do mundo, para serem avistados pelos homens e admirados pelo reflexo do caráter de Jesus, nosso grande libertador, e ainda, que muitas pessoas vejam a luz do evangelho em nós e se preparem para a maior visão que o universo em breve irá revelar: A volta de Jesus em glória e majestade.

REFERENCIAS:
WHITE, Ellen G. O GRANDE CONFLITO, Tatuí, SP, CPB, 1988.
FOUCAULT, Michel. VIGIAR E PUNIR. Petrópolis, RJ, Vozes, 1987.


Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *